Nos bastidores do Congresso Nacional, uma proposta de Reforma do Código Civil vem ganhando cada vez mais força — e, com ela, a possibilidade de mudanças relevantes para quem atua no mercado imobiliário. A proposta, que está sendo discutida no Senado, pretende atualizar o Código para refletir os desafios e valores do século XXI, especialmente no que diz respeito à sustentabilidade e à função social (e agora também socioambiental) da propriedade.
Sabido é que, previsto na Constituição Federal artigo 5º inciso XXIII, à propriedade sempre foi incumbida a função social, isto é, este principio estabelece que a propriedade deve ser utilizada de forma a atender também os interesses da sociedade e não somente do proprietário.
Todavia, a partir da alteração do Código Civil se aprovada, mantém e aprofunda este princípio, reforçando a ideia de que o direito à propriedade não é absoluto, e, considerando a crescente preocupação com a sustentabilidade, a legislação passaria a salvaguardar o dever de a propriedade ser utilizada de forma a garantir a preservação dos recursos naturais, a manutenção de um ambiente saudável e o desenvolvimento socioeconômico da região onde está localizada.
Mas o que isso muda, na prática, para corretores, imobiliárias, loteadoras, incorporadoras e investidores?
A propriedade com propósito: mais do que um ativo, um compromisso coletivo.
Como trouxemos acima, a Constituição Federal já prevê que a propriedade deve cumprir uma função social. Isso significa que não basta ter um imóvel — é necessário que ele tenha uma utilidade que beneficie também a coletividade.
Com a Reforma, ganha força o conceito de função socioambiental da propriedade, que traz o meio ambiente e o desenvolvimento urbano sustentável para o centro da discussão. Para o setor imobiliário, isso pode representar tanto desafios jurídicos, como grandes oportunidades de inovação e diferenciação no mercado.
Na prática, isso significa que empreendimentos imobiliários, loteamentos e grandes incorporações não podem ser pensados apenas sob o viés econômico. É preciso ir além. Incorporar critérios de sustentabilidade, investir em infraestrutura verde, mitigar impactos ambientais e gerar benefícios coletivos é o caminho para um mercado mais moderno e conectado com os desafios do presente.
Um novo cenário para empreendimentos urbanos
A proposta de alteração no Código Civil quer consolidar legalmente o que o mercado já começa a perceber: empreendimentos que respeitam o meio ambiente criam impacto social positivo e se conectam com as políticas públicas urbanas são mais valorizados, mais bem aceitos pela sociedade e, muitas vezes, mais rentáveis.
Instrumentos como:
…passam a ser cada vez mais importantes para loteadoras, incorporadoras e gestores do mercado.
Direito Civil e Direito Urbanístico: cada vez mais integrados
Um ponto alto da proposta é a tentativa de aproximar o Direito Civil das políticas públicas urbanas e ambientais, promovendo uma leitura mais sistêmica da propriedade, da ocupação do solo e do impacto urbano.
Isso significa que os negócios jurídicos envolvendo imóveis precisarão observar, além dos aspectos contratuais e registrários, diretrizes de planejamento urbano, regularização, preservação ambiental e impacto social.
As mudanças climáticas e os impactos socioambientais causados pela ocupação desordenada do solo exigem uma resposta normativa mais robusta e atualizada. Nesse cenário, é fundamental que o Código Civil reflita, de maneira concreta, os compromissos com o desenvolvimento sustentável.
Incorporar diretrizes que incentivem práticas responsáveis por parte dos agentes econômicos — especialmente no setor imobiliário — representa um passo decisivo para integrar o Direito Privado às urgências ecológicas do nosso tempo.
Ao inserir dispositivos que reforcem a responsabilidade pelos danos causados ao meio ambiente e que consolidem a função socioambiental da propriedade, a proposta de reforma da codificação civil aproxima o ordenamento jurídico das diretrizes das políticas públicas ambientais, promovendo um sistema mais coerente e comprometido com o bem coletivo.
O que você precisa começar a considerar desde já:
Oportunidades à frente
Para quem trabalha com o desenvolvimento urbano, a Reforma do Código Civil não é um obstáculo, mas um sinal de tendência: o mercado está mudando, e a legislação está acompanhando essa evolução. Quem sair na frente, adaptando estratégias e modelos de negócio, poderá liderar o movimento por cidades mais inteligentes, inclusivas e sustentáveis — com segurança jurídica e retorno financeiro.
A Reforma do Código Civil representa uma janela de oportunidade para incorporar definitivamente a sustentabilidade como diretriz estrutural do ordenamento jurídico privado. Para incorporadoras, loteadoras e demais agentes do setor imobiliário, essa mudança exige adaptação — mas também abre espaço para inovação, valorização e responsabilidade.
Mais do que uma mudança legislativa, esta reforma aponta para um novo posicionamento do mercado e da sociedade: a propriedade não é apenas um direito individual, mas um instrumento de transformação urbana e ambiental, e o novo Código Civil tem tudo para ser o marco dessa virada. Para quem atua no setor imobiliário, entender e incorporar essa visão é mais do que necessário — é estratégico.
Por óbvio, como toda mudança, a reforma enfrenta críticas e sem dúvidas ainda passará por ajustes e discussões, mas inquestionável é que o mundo está mudando e a legislação precisa acompanhar, afinal, o futuro será dos que souberem alinhar segurança jurídica, responsabilidade socioambiental e inteligência de mercado.
Advogada, sócia fundadora do Escritório Alves Penello Advocacia e Consultoria, especialista em Direito Imobiliário com mais de 10 anos de atuação.
Mestranda em Direito das Relações Econômicas e Sociais pela Instituição Milton Campos, Vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário OAB/MG, subseção do Barro Preto, Co-líder da Regional Minas Gerais do Instituto Mulheres do Imobiliário e Secretária AMADI Mulher.