O novo modelo de utilização dos recursos da poupança, anunciado nesta semana pelo governo federal, promete destravar o mercado de crédito imobiliário no país. Com a mudança, mais de 80 mil novos financiamentos habitacionais devem ser viabilizados apenas pela Caixa Econômica Federal, segundo estimativa do próprio governo.
Na avaliação do especialista em mercado imobiliário Daniel Claudino, a medida representa um avanço estrutural no setor ao ampliar a oferta de crédito sem desmontar os mecanismos de proteção ao tomador de financiamento. “Estamos diante de uma reconfiguração importante. Ao reduzir o compulsório e permitir o uso mais flexível dos recursos da poupança, o governo injeta liquidez no sistema e incentiva os bancos a voltarem a operar com mais escala”, afirma.
Atualmente, os bancos que captam recursos via poupança são obrigados a destinar parte desse montante ao crédito habitacional no SFH (Sistema Financeiro da Habitação), outra parte fica retida como compulsório e apenas uma fração pode ser usada livremente. O novo modelo altera essa lógica.
A partir de agora, os bancos que conseguirem captar recursos no mercado com finalidade específica para o financiamento imobiliário ganharão o direito de acessar uma fatia maior da poupança com liberdade de uso. O incentivo, segundo Claudino, é mais eficiente e permite aos bancos ajustarem suas estratégias com mais previsibilidade.
“É como num prédio com escassez de água: antes, você só podia usar a maior parte da água para banho, outra parte ficava guardada à força, e só um pouco podia usar livremente. Agora, o síndico diz: você pode usar mais água como quiser — desde que traga água extra de fora para uso comum. Isso muda o jogo sem causar desequilíbrio”, compara.
A expectativa é que o novo arranjo aumente a liquidez disponível para o crédito imobiliário já no curto prazo. A mudança deve facilitar o acesso ao financiamento, principalmente para a classe média, com maior aprovação de crédito, alongamento de prazos e retomada de operações que estavam represadas.
Além disso, ajustes paralelos no uso do FGTS e a ampliação do programa Minha Casa, Minha Vida ajudam a preservar o foco na habitação popular e equilibrar a demanda em diferentes faixas de renda.
“O impacto imediato não é uma queda nos juros — até porque a Selic ainda é um limitador importante —, mas é um destravamento operacional. Com mais funding e incentivos mais bem desenhados, o mercado volta a ter base para crescer. E se o ciclo de juros começar a ceder, o efeito tende a ser ainda mais forte”, avalia Claudino.
Para o especialista, a medida traz de volta um ingrediente essencial ao mercado: a confiança. “Com previsibilidade, os bancos conseguem originar crédito com mais segurança e em maior volume. Isso pode ser determinante para reduzir o déficit habitacional nos próximos anos e reaquecer a cadeia da construção civil”, conclui