Dias atrás, recebi pela internet um vídeo que me despertou saudades e emoções. Em rápida reportagem, de 2017, Alexandre Garcia, então apresentador do Jornal Nacional, da Rede Globo, relata uma história que, talvez, sirva de alento e esperança para aqueles que já não creem em política, e em políticos. Ele começa afirmando: “o Jornal Nacional vai contar agora mais uma história de um político que recebeu um presente. Só que, desta vez, a história não tem nada a ver com corrupção ou dinheiro público”.
Diz o repórter Wilson Kirsche de Curitiba: “Carro 1967, único dono, e muitas histórias. É a imagem bem conservada do reconhecimento de um povo a um político cheio de virtudes. O nome dele era Milton Luiz Pereira”. Nascido em Ipatinga, São Paulo, Milton Luiz Pereira formou-se em Direito pela Faculdade de Direito da UFPR, em 1958. Foi trabalhar em Campo Mourão, norte paranaense. Elegeu-se Prefeito e governou a cidade de 1964 até abriu de 1967 quando, aprovado em concurso público, renunciou ao cargo e se tornou Juiz Federal. Depois, foi Desembargador e Ministro do STJ. Faleceu em 2012, um dia após o falecimento de sua esposa.
Como Prefeito, abriu estradas, construiu escolas, biblioteca e pôs em dia as finanças do município, em gestão transparente, cuja prestação de contas era mensalmente transmitida pelo rádio. Em seu discurso de despedida, afirmou: “Saio, principalmente, com a consciência tranquila do dever cumprido. Trabalhei o que pude. Não fiz mais porque, talvez, fosse impossível”. A cidade entrou em comoção. Agradecidos, os moradores fizeram uma “vaquinha” e o presentearam com um fusca azul, cor da cidade. O prefeito andava a pé desde que tivera de vender o carro para pagar contas pessoais e manter a família. O fusca, em 2017, aos 50 anos do fato, foi restaurado e enviado à cidade, para exposição.
Pois bem! Em 1979, estava eu no terceiro ano do Curso de Direito, na Faculdade de Direito de Curitiba. Meu professor de Direito Penal era justamente o Juiz Federal Milton Luiz Pereira que, ao final da aula, costumava caminhar papeando com os alunos até o estacionamento, onde estava o seu velho e leal fusca azul. Em toda a sua vida, ele nunca trocou de carro. Numa dessas caminhadas, ao meu lado, apareceu um pedinte implorando-lhe por uns trocados. O professor procurou em seus bolsos e nada encontrou. Então, virando-se para mim, perguntou se eu não tinha algum trocado. Imediatamente, saquei da carteira uma nota de um Cruzeiro* e a entreguei ao pedinte. O mestre me agradeceu.
Alguns meses depois, eu já nem me lembrava do fato. Em sala de aula, fazendo prova de Direito Penal. De repente, o Professor Milton Luiz Pereira para ao meu lado, saca do bolso uma cédula de um Cruzeiro*, bem enroladinha, como se fosse um cigarro ou algo parecido, e, sem que ninguém percebesse, sorrateiramente, coloca a nota em minha mão e, com toda a pureza de sua alma, sussurra no meu ouvido: “estou-lhe pagando o empréstimo que você me fez, para que eu pudesse doar ao pedinte, lembra-se? ” Surpreso, sem poder contestar, até por conta do momento solene de prova, aceitei e agradeci. A lembrança deste singelo, mas significativo episódio, levarei comigo por toda a minha vida, como um verdadeiro TRIBUTO À HONESTIDADE.