Cidades como plataformas: o mercado imobiliário na lógica das Big Techs

*Por Manuel Arrey

O mercado imobiliário ainda se define pelo que constrói: prédios, casas, condomínios, shoppings. Mas talvez esteja olhando para o lado errado. Se observarmos a trajetória das Big Techs, percebemos que o valor não estava nos produtos isolados, mas no ecossistema que orquestraram. Elas não vendem apenas serviços. Oferecem plataformas que integram milhares de outros negócios. É exatamente isso que o mercado imobiliário precisará aprender: pensar cidades como plataformas.

Hoje, um empreendimento imobiliário é comercializado como ativo físico, desconectado de serviços essenciais. O comprador adquire um apartamento, mas a mobilidade, a energia, a segurança, a cultura e a comunidade permanecem fragmentadas. O resultado são cidades caóticas, onde cada agente trabalha de forma isolada. Mas o futuro aponta para outro modelo: ecossistemas urbanos integrados, em que a incorporadora não vende apenas imóveis, mas acesso a uma plataforma de serviços contínuos.

Esse movimento já começa a dar sinais. Condomínios inteligentes oferecem gestão de energia compartilhada. Bairros planejados integram escolas, hospitais, coworkings e comércio em um mesmo ecossistema. Cidades privadas, algumas já em desenvolvimento na Ásia e no Oriente Médio, operam como verdadeiras plataformas de dados, monetizando mobilidade, energia e até cultura. O imóvel, nesse modelo, é apenas a porta de entrada para um marketplace urbano.

Para o mercado imobiliário, essa transição exige uma mudança de identidade. Incorporadoras precisarão pensar menos como construtoras e mais como orquestradoras. Precisarão lidar com dados, integrar startups de mobilidade, fintechs, healthtechs, energias renováveis, empresas de entretenimento. O valor não estará na torre construída, mas na densidade do ecossistema conectado ao seu redor.

Imagine um bairro que monetiza desde a energia solar compartilhada até a logística de última milha. Imagine uma cidade que coleta dados em tempo real para otimizar trânsito, consumo de água e segurança pública. Imagine incorporadoras que não lucram apenas com a venda inicial das unidades, mas com a recorrência dos serviços oferecidos. O modelo de negócio deixa de ser transacional e se torna plataformizado, como já acontece em quase todos os outros setores.

O futuro não premiará quem construir mais edifícios, mas quem construir infraestruturas urbanas inteligentes, integradas e capazes de gerar valor contínuo. O mercado imobiliário que sobreviverá será aquele capaz de pensar menos como concreto e mais como código.

A cidade não é mais apenas o lugar onde se habita. É a plataforma que organiza nossa vida em rede.

Manuel Arrey é Fundador do Grupo Arrey, com mais de 40 anos de experiência nos setores industrial, imobiliário e hoteleiro, e idealizador do Sophia Riviera – condomínio resort que traduz na prática essa visão de integração entre sofisticação, sustentabilidade e estilo de vida global

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