Os leilões judiciais representam uma excelente oportunidade para adquirir bens imóveis a preços atrativos, mas frequentemente geram dúvidas, especialmente quanto à responsabilidade por débitos preexistentes. A clareza nesse ponto é fundamental para que o investidor faça um negócio seguro e rentável.
Vamos explorar a natureza da arrematação e as nuances da responsabilidade por dívidas de IPTU e condomínio, especialmente no cenário paulista.
A Natureza Jurídica da Arrematação no Estado de São Paulo:
No Estado de São Paulo, a arrematação judicial possui natureza jurídica derivada no tocante à aquisição do título. Isso significa que, embora a aquisição ocorra por força de uma ordem judicial, ela se vincula ao histórico do imóvel e precisa seguir os princípios registrais.
A arrematação não “apaga” a cadeia dominial anterior, é necessário que todos os gravames sejam baixados e consequentemente haja o registro da carta de arrematação com a efetiva transferência da propriedade.
Responsabilidade pelos Débitos: IPTU e Condomínio
A grande preocupação de quem arremata um imóvel em leilão é herdar dívidas do antigo proprietário. Contudo, a jurisprudência e a legislação têm evoluído para trazer mais segurança jurídica ao arrematante.
No que se refere ao Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), a questão da responsabilidade por débitos pretéritos já foi amplamente debatida e sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Tema Repetitivo 1134 estabeleceu o entendimento de que, em regra, os débitos de IPTU incidentes sobre o imóvel são sub-rogados no preço da arrematação, ou seja, são pagos com o valor obtido no leilão.
Tese Firmada Tema Repetitivo 1134 STJ: Diante do disposto no art. 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação
Isso significa que, ainda que os débitos sejam anteriores à arrematação, eles não são de responsabilidade do arrematante. O valor da dívida é deduzido do montante arrecadado na venda do imóvel, e o arrematante recebe o bem livre de tais ônus. Essa tese traz uma segurança considerável para quem investe em leilões.
A situação dos débitos condominiais é um pouco mais complexa e gera debates no meio jurídico. Em tese, a regra geral é a sub-rogação dos débitos no preço da arrematação, conforme o artigo 908, parágrafo único, do Código de Processo Civil (CPC),
Art. 908 CPC . Havendo pluralidade de credores ou exequentes, o dinheiro lhes será distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas preferências.
Portanto, em regra, as dívidas de condomínio também seriam pagas com o valor da venda do imóvel, e o arrematante não as herdaria, entretanto, há uma corrente de Magistrados que entende de forma diferente. Baseiam-se no artigo 1.345 do Código Civil
“Artigo 1.345 CC – O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios.”
Essa interpretação, embora minoritária em alguns contextos, gera um risco para o arrematante, pois pode implicar na sua responsabilidade pelos débitos condominiais pretéritos. A argumentação se baseia na natureza propter rem da dívida, que acompanha o imóvel independentemente de quem seja o proprietário.
A Importância Crucial da Leitura do Edital
Diante das nuances jurídicas, especialmente no que tange aos débitos condominiais, a leitura minuciosa do edital do leilão é absolutamente crucial. O edital é a “lei” do leilão, o documento que estabelece as regras específicas daquele ato, incluindo a existência de débitos e a responsabilidade por eles.
É no edital que você encontrará informações claras sobre a existência de débitos, deve indicar se tais dívidas serão sub-rogadas no preço da arrematação ou se o arrematante as assumirá. Desconsiderar a leitura do edital é assumir um risco desnecessário que pode transformar uma oportunidade em um prejuízo.
Tripé da Operação
Participar de leilões judiciais exige mais do que apenas capital, requer conhecimento e estratégia, sempre respeitando o tripé da operação:
Leilão – Uma Ferramenta para Construção de Patrimônio
Apesar dos desafios e da complexidade jurídica, a aquisição de imóveis em leilão, quando feita com diligência e planejamento, é uma ótima ferramenta para a construção de um patrimônio sólido e rentável. Com a devida análise do edital e o suporte de profissionais capacitados, é possível mitigar os riscos e aproveitar as vantagens que essa modalidade de aquisição oferece.
Lembre-se sempre: o sucesso no leilão reside na informação e na prevenção de surpresas. Invista em conhecimento!
Advogada especialista em aquisições de bens em Leilão Judicial e Extrajudicial, além de estruturação de negócios no segmento de distressed assets – Formada Pela UniFmu, Pós-graduada em Direito Empresarial, Notarial e Registral e MBA em Direito Imobiliário pelo Legale. Mestranda em Resolução de Conflitos e Mediação pela Universidade Europeia do Atlântico. Coordenadora dos núcleos de leilão e protesto e notas da Adnotare e Núcleo de Educação da Abraim, Vice-presidente da Comissão de Leilão Judicial e Extrajudicial da OAB/Jabaquara, Membro da Comissão Especial de Direito Bancário da OAB/SP, Comissão de Estudo em Falência e Recuperação Judicial da OAB /Campinas, ABA – Comissão de Leilões Regional Sudeste e integrante do ImobPorElas. Professora e autora de diversos artigos jurídicos. Atua na assessoria especializada para investidores, leiloeiros, advogados e administradores judiciais.