Imagine a seguinte situação: a imobiliária está intermediando uma compra e venda de um imóvel e ao solicitar a matrícula de inteiro teor para averiguar a regularidade do bem o corretor de imóveis se depara com uma averbação acautelatória informando a existência de um processo judicial e, consequentemente, fica na dúvida de qual o procedimento seguir e o possível empecilho para a concretização do negócio.
A averbação acautelatória nada mais é do que uma anotação na averbação da matrícula que visa tornar público a terceiros interessados que o referido imóvel está sendo objeto de discussão processual.
A anotação possui previsão no art. 167, item 12, da Lei de Registro Públicos e é realizado somente mediante decisão judicial.
O registro é realizado no Cartório de Imóveis onde o respectivo bem estiver matriculado, cuja solicitação pode ser feita pela parte que estiver em litigio até que a discussão processual seja devidamente encerrada.
O objetivo dela é evitar que o imóvel seja dilapidado a terceiros e prejudique o interessado/autor da ação judicial. Todavia, a averbação não se torna um impeditivo, de fato, de transferência, mas sim um alerta para aquele que está adquirindo o patrimônio. Ao contrário da penhora que é anotada no documento do imóvel e visa impedir a alienação e cessão para terceiros, haja vista que a restrição possui o objetivo de quitação de dívida.
Portanto, a penhora impede a venda ou transferência de imóvel para terceiros sem a autorização do magistrado que determinou a inclusão da restrição.
Apesar disso, a averbação acautelatória é utilizada como analogia da averbação premonitória prevista no art. 828 do Código de Processo Civil, instituto utilizado, também, nas execuções judiciais que visa a cobrança de dívida.
No dia a dia do profissional que atua na área do direito imobiliária é muito comum que a averbação premonitória seja solicitada já no processo de conhecimento, utilizado, tão somente, como forma de tornar pública a existência da ação judicial. Como por exemplo, o ingresso de uma ação de obrigação de fazer para transferência da propriedade do imóvel adquirido.
Nesse sentido é o entendimento da maioria dos Tribunal de Justiça, conforme julgados abaixo:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PERDAS E DANOS. DECISÃO DETERMINANDO AO REGISTRO DE IMÓVEIS A AVERBAÇÃO ACAUTELATÓRIA. RECURSO DA PARTE REQUERIDA. 1. ALEGAÇÃO DE QUE A ORDEM JUDICIAL ESTÁ EIVADA DE ILEGALIDADE. TESE ACOLHIDA. AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA QUE PODE SER AUTORIZADA NA FASE DE CONHECIMENTO, POR ANALOGIA AO ART. 828 DA LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL, DESDE QUE PRESENTES OS REQUISITOS DA TUTELA DE URGÊNCIA, PREVISTOS NO ART. 300 DO MESMO DIPLOMA LEGAL. PARTE AUTORA, ENTRETANTO, QUE SEQUER FORMULOU PEDIDO EM JUÍZO PARA A AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA, COM FULCRO NO ART.
300 DO CPC. ADEMAIS, INEXISTÊNCIA DE DECISÃO
FUNDAMENTADA AUTORIZANDO A ANOTAÇÃO. MEDIDA ADOTADA SEM A OBSERVÂNCIA DOS QUESITOS LEGAIS. CONSTATADA A GRANDE CONFUSÃO OCORRIDA TANTO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS QUANTO NA VARA EM QUE TRAMITA A AÇÃO PRINCIPAL. CANCELAMENTO DA AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA NAS MATRÍCULAS QUE SE IMPÕE. 2. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC,
Agravo de Instrumento n. 5048693-81.2023.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Raulino Jacó Bruning, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 08-02-2024).
E ainda:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RESOLUÇÃO CONTRATUAL. PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA PARA AVERBAÇÃO DA EXISTÊNCIA DA DEMANDA NA MATRÍCULA DE BEM OBJETO DO LITÍGIO. INDEFERIMENTO. RECURSO DAS AUTORAS. ALEGADO DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE COTAS SOCIETÁRIAS E DO IMÓVEL ONDE SEDIADA A EMPRESA. AVERBAÇÃO ACAUTELATÓRIA DE EXISTÊNCIA DA DEMANDA QUE DÁ PUBLICIDADE A TERCEIROS E NÃO OBSTACULIZA A LIVRE NEGOCIAÇÃO DO BEM. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO AGRAVADO. PROVIDÊNCIA CABÍVEL COM BASE NO PODER GERAL DE CAUTELA DO JUIZ. RECURSO PROVIDO. (TJSC,
Agravo de Instrumento n. 5020219-71.2021.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 20-07-2021)
Observa-se no julgado acima que a averbação de fato não impede a alienação do bem, motivo pelo qual possui, tão somente, o objetivo de alertar sobre a existência de ação judicial que possa afetar a propriedade do bem.
Contudo, importante mencionar que, apesar dos cartórios de registros não impediram a transferência quando prevista a existência de uma averbação acautelatória, a depender do caso e do resultado da ação judicial, a escritura pública de transferência e o negócio jurídico poderá ser anulado pelo titular de direito que realizou a averbação.
Sendo assim, ao corretor de imóvel que se deparar com a situação relatada, cabe a ele contatar advogado visando obter maiores informações sobre o processo judicial que se encontrar averbado na matrícula do imóvel e averiguar os riscos de alienação do patrimônio, bem como as possibilidades de resolução do caso apontando ao comprador as consequências jurídicas.
Outrossim, se ao analisar os riscos, o comprador desejar seguir com a aquisição do imóvel caberá a ele providenciar algumas hipóteses para baixa da averbação. Como por exemplo: acordo no processo judicial e/ ou requerer decisão judicial autorizando a retirada da averbação (quando for o caso). Posteriormente, requerer perante ao cartório a baixa do registro mediante certidão ou ofício judicial (expedido pelo cartório da comarca) e realizar o pagamento das taxas administrativas perante o Registro de Imóveis.
Dessa forma e considerando que cabe ao corretor de imóveis a análise de toda a documentação e intermediação como parte do seu ofício (art. 473 do Código Civil) ao se deparar com a averbação convém a este explanar ao comprador o significado da averbação levantando os riscos da aquisição e as possibilidades de resolução do processo judicial.
Advogada (OAB/SC 61.164) e Pós-graduanda em Direito Imobiliário.
Atua como advogada associada no escritório de advocacia Pavão Advogados e Associados.