Pois bem, como toda matéria que escrevo, penso de grande valia fazer breve menção a origem do tema discutido, portanto, vamos em 2008 em San Francisco (USA), com o Fundar da empresa Airbnb, pioneira como plataforma digital de turismo no contexto de curta hospedagem (mais uma das ideias de economia do compartilhamento).
Por ser a pioneira, seu nome tornou-se praticamente o produto e não apenas uma marca, vindo a ter seu nome ventilado entre operadores, administradores de locação, proprietários de imóveis, legisladores e usuários.
Inicialmente a discussão era quanto a sua legalidade, o que, sinceramente, me parecia um absurdo tal pauta em vista do Direito de Propriedade assegurado pela constituição Federal (Art. 5, XXII, CF).
De igual forma, a Lei que rege as locações, nunca dispôs de prazo mínimo para locações, vindo apenas ressaltar cuidados conforme tempo, por lógica de outras situações adversas que podem influenciar na locação e que devem ser operadas com muito cuidado a fim de resguardar sempre o respeito e direito das partes e terceiros.
Em destaque, o artigo 48 da lei do inquilinato (aluguel por temporada) em nada se opõe à locação de imóveis de curta estadia, fazendo menção tão somente ao prazo de 90 (noventa) dias o qual configura a locação por temporada e que pode ser prorrogado por mais tempo não havendo oposição do locador em até 30 (trinta) dias pós findar do prazo;
Porém, contudo, entretanto, mesmo em plena legalidade e de grande valia para os proprietários que vislumbraram na sistemática uma maneira de rentabilizar seus imóveis (participando de perto da locação ou não), por óbvio, devemos pensar no coletivo quando se trata de imóveis em locais coletivos onde possuem regras de convivência, como exemplo o condomínio edilício:
A Lei de Condomínios nº 4.591/1964, prescreve: “cada condômino tem o direito de usar e fruir, com exclusividade, de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses”, devendo observar as normas de boa vizinhança”, e aqui se acrescenta, convenção condominial e regimento interno.
E neste ponto inicia a segunda e mais duradoura discussão a qual culminou abarcada pela lei em destaque no início da matéria e que, ainda assim, é objeto de muitas pautas condominiais e dissabores entre vizinhos e síndicos.
Pois bem, a contenda e preocupação do uso da sistemática de “curta estadia”, se deu pelo mesmo motivo em que se proíbe em condomínios (não mistos) atividades de cunho comercial, ou uso de piscinas, academias por grande número de visitantes: segurança e sossego.
Quanto mais se abre possibilidades de ingresso de pessoas ao condomínio e negócios, falamos no aumentar do fluxo de pessoas estranhas ao condomínio, as quais podem ou não ser pessoas boas condutas e intenções com a unidade locada e às áreas comuns.
Aumenta a exposição não só do imóvel à maior número de pessoas, como concede acesso dessas pessoas às áreas comuns do condomínio, vulnerabilizando a segurança e sossego dos demais condôminos (em sua maioria que residem com sua família).
Engana-se quem ache que a problemática é local (Brasil). Nos Estados Unidos, berço da plataforma em questão, diversas cidades já discutiram e impuseram restrições às locações de curta duração (San Francisco, New York, Las Vegas, entre outras várias).
Na Europa a pressão das cidades também restara tamanha à ponto de exigirem da Comissão Europeia regras mais rígidas à atividade da locação.
Em alguns municípios americanos, além da problemática disposta, por tratar-se de cidades turísticas, houve drástica redução de ofertas de moradias disponíveis para locação comum, vindo a municipalidade legislar no sentido de colocar prazo mínimo permitido para locação em determinados locais, ou, se o proprietário optar por manter locação de temporada menor que um mês, deverá obrigatoriamente que morar no local e estar presente durante toda a estadia.
Compartilhado isso, e dado o iniciar de suas atividades no Brasil em 2011, conflitos similares aos demais países surgiram, vindo a ter suas primeiras decisões judiciais repetidas em 2021 no sentido de que os condomínios poderão proibir a atividade, desde que, conste a proibição na convenção condominial e/ou regimento interno. Logo, no iniciar de 2022, promulgou-se lei que facilitou a alteração da convenção e regimento interno; no intuito de suprir a necessidade e vontade dos condôminos quanto a decisão de possibilitar ou não o uso da sistemática “Short Stay” no condomínio.
Ainda há quem sustente que a proibição em regimento interno ou convenção condominial confronte o direito de propriedade, porém, todos os adquirentes de unidades em condomínio, ao adquirem tal tipo de moradia, já estão cientes que muitas de suas liberdades serão limitadas em prol do coletivo, vindo tal possibilidade de proibição do “airbnb” ser apenas mais uma das regras de boa convivência, sossego e segurança pró coletivo.
“A possibilidade de os próprios condôminos de um condomínio edilício de fim residencial deliberarem em assembleia, por maioria qualificada (de dois terços das frações ideais), permitir a utilização das unidades condominiais para fins de hospedagem atípica, por intermédio de plataformas digitais ou outra modalidade de oferta, ampliando o uso para além do estritamente residencial e, posteriormente, querendo, incorporarem essa modificação à Convenção do Condomínio”.( REsp 1819075, quando por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
Sendo assim, com a facilitação de ampliação do quórum de votação trazido pela lei de março de 2022, e decisão do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, tal direito ou proibição poderá se dar por escolha e voto dos condôminos, compreende-se que esse é o caminho adequado e vislumbrado hoje para o regulamentar a questão de curta hospedagem dentro de condomínios residenciais.
Para impedir a locação na modalidade “Short Stay”, será necessária a inserção de artigo na convenção do condomínio, com aprovação do quórum mínimo de dois terços dos proprietários dos imóveis em assembleia. Se o quórum mínimo não for atingido na data específica da assembleia, a votação ficará em aberto por até 90 dias para que os condôminos possam registrar seus votos de forma eletrônica (desde que essa possibilidade esteja clara na ata de convocação), sendo, consequentemente a decisão prorrogada até que todos votem ou até o findar dos 90 dias dispostos hoje em Lei 14.309/22.
Ainda possui dúvidas de como proceder em seu condomínio? Necessita de auxílio com a revisão e alteração dos instrumentos de convenção condominial e regimento interno?
Busque sempre um advogado especializado.
OAB/SC 35.851
Advogada proprietária do escritório Pavão E Associados – Advocacia e Consultoria Imobiliária.
Especialista em Direito Empresarial, Tributário e Imobiliário.
Diretora Regional NSC do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário
Autora de cursos na área imobiliária
Palestrante da área imobiliária
Técnica em Transações imobiliárias