A Constituição Federal brasileira, promulgada em 05 de outubro de 1988, estabelece: “Art. 20. São bens da União: I – os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos; (…) XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”. Pois bem! A Câmara dos Deputados votou e aprovou, no dia 30 de maio, o PL (Projeto de Lei) nº 490/2007, restringindo a demarcação de terras indígenas àquelas tradicionalmente por eles ocupadas na data da promulgação da CF. O assunto tem despertado muita polêmica, inclusive nos meios imobiliários.
Marco temporal (para demarcação de terras indígenas) é uma tese jurídica. Segundo ela, o direito de ocupação de terras pelos indígenas depende de sua posse na data da promulgação da CF. Eles só podem ocupar terras que já ocupavam ou cuja posse já se encontrava em disputa judicial naquela data. Esse entendimento foi admitido pelo STF, em 2009, na demarcação da reserva Raposa- Serra do Sol, em Roraima. Atualmente, o tema voltou ao Supremo, mas já teve seu julgamento adiado por sete vezes. Novos embates estão marcados para o dia 7 de junho.
Até o momento, dois ministros já votaram: um a favor e outro contra a manutenção do marco temporal. A questão é que, em 2003, foi criada a terra indígena Ibirama-Laklãnõ. Parte dela, no entanto, ocupada por indígenas Xokleng e disputada por agricultores, está sendo reivindicada pelo governo catarinense. O STF terá de decidir pela manutenção ou não da Súmula 650, por ele firmada, que afirma: “Os incisos I e XI do art. 20 da Constituição Federal não alcançam terras de aldeamento extintos, ainda que ocupadas por indígenas em passado remoto”.
Na prática, a Súmula decidiu que: “terras tradicionalmente ocupadas por indígenas não abrange aquelas que eram possuídas pelos nativos em passado remoto”. Mas a disputa no STF parece que será renhida. O ministro Nunes Marques, a favor do marco, afirma que, sem ele, haveria expansão ilimitada das pretensões demarcatórias sobre áreas já incorporadas ao mercado imobiliário em todo o país. Estariam em risco a soberania, a independência e a segurança jurídica nacionais. A extinção do termo, segundo Marques, abriria espaço para permanentes conflitos.
Já o ministro Fachin, contra o marco, defende que a CF reconhece que o direito dos povos indígenas sobre suas terras é direito originário, anterior à própria formação do Estado. Assim, sua demarcação é ato meramente declaratório, que não cria direito, mas apenas o reconhece. Fachin considera que o marco temporal ameaça a sobrevivência de florestas e comunidades indígenas; que trará o caos jurídico ao país com o requerimento de revisão de muitas reservas já demarcadas. Como se pode deduzir, há inúmeros argumentos de ambos os lados.
A Câmara Federal, preocupada em, mais uma vez, ver esbulhadas suas prerrogativas, decidiu agir e aprovou o PL 490/2007, que vai agora à apreciação pelo Senado. A nova lei garantirá a permanência do marco temporal. A vitória foi escorchante: 283 votos a favor e apenas 155 contra. A extinção do marco acabaria com a segurança jurídica do mercado imobiliário e abalaria o direito de propriedade. Em tese, todo o território nacional poderia ser reivindicado, já que as terras brasileiras, antes do descobrimento, eram ocupadas pelos indígenas que aqui viviam.