Por Flávia Pinheiros – Mediadora, Administradora de imóveis e Especialista em Gestão Contratual com IA para o mercado imobiliário.
O Brasil está passando por uma transformação demográfica sem precedentes. Em 2024, temos 33 milhões de brasileiros com 60 anos ou mais – número que mais que dobrou nas últimas duas décadas. Segundo projeção do IBGE, o país pode ter 75,3 milhões de pessoas idosos em 2070, quando os representantes desta faixa etária chegaram a ser 37,8% do total da população.
Esta mudança traz uma realidade inevitável: a maior parte do patrimônio imobiliário brasileiro será transferida por herança nas próximas décadas. E aqui mora o problema – segundo o CNJ, os processos de inventário e partilha correspondem a cerca de 10% do total de processos em tramitação no país, com duração média de 1 ano e 9 meses, podendo se estender por décadas.
Diferente do testamento tradicional, o “testamento vital” do patrimônio é um conjunto de estratégias implementadas ainda em vida para garantir que os imóveis sejam transferidos de forma eficiente, protegida e sem conflitos familiares.
É como criar um “GPS” para o seu patrimônio – um caminho claro e organizado que seus herdeiros seguirão, evitando desvios custosos e demorados.
Os números são alarmantes: a doação com reserva de usufruto permite que o proprietário doe o imóvel aos seus herdeiros, mas mantém o direito de usufruto, ou seja, pode continuar utilizando o bem ou recebendo rendimentos dele (como aluguel) enquanto estiver vivo. Quando bem estruturada, essa estratégia pode:
1) Doação com Reserva de Usufruto
A mais comum e eficiente. Você doa o imóvel mas mantém o direito de usá-lo ou receber os aluguéis até o fim da vida. Vantagem: elimina o inventário desse bem. Cuidado: impossível reverter sem concordância do donatário.
2) Holding Familiar
Para quem possui um patrimônio imobiliário significativo, a criação de uma holding familiar pode ser a melhor alternativa para a sucessão de bens. Os imóveis ficam na empresa, e os herdeiros recebem quotas societárias.
3) Testamento com Cláusulas Específicas
Um testamento bem elaborado pode determinar exatamente qual imóvel vai para qual herdeiro, evitando disputas e facilitando a partilha.
4) Seguro de Vida Imobiliário
Estratégia menos conhecida onde o seguro cobre custos de inventário e impostos, mantendo o patrimônio íntegro para os herdeiros.
5) Trust Brasileiro (Fiduciário)
Ainda em desenvolvimento na legislação brasileira, mas já possível em algumas estruturas específicas.
⚠️ Legítima dos herdeiros: No Brasil, você só pode dispor livremente de 50% do patrimônio
⚠️ ITCMD: Imposto sobre doações varia de 4% a 8% conforme o estado
⚠️ Consenso familiar: Estratégias impostas geram mais conflitos que soluções
A perspectiva do Direito Sistêmico nos ensina que cada família é um sistema único, com dinâmicas, valores e necessidades específicas. O planejamento sucessório eficaz não pode ignorar essas constelações familiares.
Muitas vezes, o que parece ser uma resistência “irracional” de um herdeiro esconde questões emocionais mais profundas – sentimentos de exclusão, medo de perder o lugar na família, ou até mesmo lealdades inconscientes com gerações anteriores. Uma escuta sistêmica dessas dinâmicas é fundamental para que o planejamento patrimonial não se torne um campo de batalha familiar.
A resposta é simples: agora. O planejamento sucessório não é sobre estar próximo da morte – é sobre estar preparado para a vida. Com a idade média da população brasileira sendo de 35,5 anos em 2023, subindo para 48,4 anos em 2070, vivemos mais e precisamos planejar melhor.
1) Inventário patrimonial: liste todos os imóveis com valores atualizados
2) Mapeamento familiar sistêmico: identifique não apenas necessidades financeiras dos herdeiros, mas também suas dinâmicas relacionais, medos e expectativas
3) Círculo de conversas familiares: promova diálogos abertos sobre o patrimônio, respeitando o tempo e as resistências de cada membro
4) Consultoria especializada integrada: procure profissionais que entendam tanto de direito sucessório quanto de dinâmicas familiares
5) Documentação consciente: organize papéis, mas também histórias – cada imóvel tem uma narrativa familiar que deve ser honrada
O envelhecimento populacional brasileiro não é uma previsão – é uma realidade presente. A população idosa no país alcançou o número de 31,2 milhões, sendo 14,7% dos brasileiros, com aumento de 39,8% no período de 2012 a 2021.
Quem entender isso agora e se preparar adequadamente estará protegendo não apenas seu patrimônio, mas o futuro de sua família. O Direito Sistêmico nos mostra que patrimônio não é apenas bem material – é também herança emocional, vínculos preservados e histórias que se perpetuam de forma saudável.
Porque o verdadeiro legado não é apenas o que deixamos, mas como deixamos – e principalmente, que relações familiares preservamos no processo.
Próxima semana: “Doação em Vida vs. Herança: Qual a Melhor Estratégia Imobiliária?” – Analisaremos quando cada estratégia é mais vantajosa e como tomar a decisão certa para seu perfil.
Quem vê resultados, nem sempre conhece a história.
Sou Flávia Pinheiros Costa, formada em Direito há 23 anos. Pós-graduada em Direito Imobiliário, Sistêmico, Contratual, Canônico e de Família. Atualmente, curso Inteligência Artificial para Advogados e sou mestranda em Mediação de Conflitos.
Mas o que realmente me move são pessoas.
Escutar histórias.
Ajudar a construir acordos.
Trazer clareza onde antes havia conflito.
E fazer do Direito uma ponte — não um muro.
Minha trajetória é marcada pela escuta ativa, pela conexão humana e pela busca constante por soluções que respeitem a lei e as relações.
Atuo como:
E, acima de tudo, sou alguém que acredita que ética, escuta e evolução diária são inegociáveis.
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