Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp 2172231/MG, relatoria da Ministra Nancy Andrighi, publicada em 16/06/2025) trouxe repercussão significativa para o mercado imobiliário ao garantir ao comprador o direito de rescindir o contrato de compra e venda de lote mesmo após o registro da escritura, quando o loteador não cumpre com sua obrigação de entregar a infraestrutura básica prometida. E mais: reconheceu-se a possibilidade de devolução integral dos valores pagos, inclusive da comissão de corretagem.
O recurso foi interposto por consumidores que adquiriram um lote em empreendimento que, mesmo após anos da venda e do registro em cartório, não contava com a infraestrutura mínima prevista em contrato, como vias de acesso, drenagem, iluminação e saneamento. O Tribunal de origem havia negado o pedido de rescisão por entender que, após o registro, não seria possível desfazer a venda. O Superior Tribunal de Justiça, no entanto, reformou a decisão.
A Corte Superior aplicou o artigo 475 do Código Civil, segundo o qual “a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato”, e também os princípios do Código de Defesa do Consumidor. Ficou assentado que a transferência da propriedade pelo registro não exime o loteador de suas obrigações contratuais, tampouco impede o comprador de rescindir o negócio diante do inadimplemento.
Além disso, o STJ destacou que a não entrega da infraestrutura básica caracteriza falha na prestação do serviço, o que autoriza a resolução do contrato com retorno das partes ao “status quo ante”, ou seja, como se a venda nunca tivesse ocorrido, o que inclui a devolução da corretagem paga, especialmente nos casos em que a venda se desfaz por culpa exclusiva do fornecedor.
A decisão traz efeitos diretos sobre a atuação de corretores e imobiliárias, uma vez que reafirma a responsabilidade objetiva do loteador no que se refere a entrega das condições mínimas de urbanização, cuja ausência invalida o negócio e autoriza a devolução integral dos valores pagos pelo comprador. Dessa forma, exige-se atenção redobrada à segurança jurídica dos contratos que devem prever mecanismos claros de rescisão e atribuição de responsabilidades em caso de inadimplemento. Além disso, o entendimento reforça que, nos casos em que o desfazimento decorre de vício ou falha do loteador, os valores pagos a título de corretagem devem ser devolvidos
O julgado reitera a proteção ao consumidor no setor imobiliário, demonstrando que a formalização da venda não encerra a responsabilidade do empreendedor. Corretores e compradores devem estar atentos: se o loteamento não entrega o prometido, a rescisão é válida e a devolução total dos valores, inclusive da corretagem é devida.
Advogada especializada em Direito Imobiliário, é sócia fundadora de um escritório de advocacia com atuação voltada à assessoria jurídica no mercado imobiliário. Com sólida experiência na área, também atua como Membro Relatora da Comissão de Direito à Cidade e da Comissão de Compliance e Governança Jurídica da OAB/PR.
Teve passagem pela CEFISP – Comissão de Ética e Fiscalização do Exercício Profissional do CRECI-PR, contribuindo ativamente para a regulação e boas práticas do setor. Reconhecida por sua atuação técnica e ética, é referência em consultoria jurídica para incorporadoras, construtoras, imobiliárias e investidores do setor.