O sinal de pagamento na compra e venda de bens imóveis

Como se sabe o contrato é o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas com a intenção de constituir, modificar e/ou extinguir direitos e deveres, sendo certo que, dentro da matriz legal existente, os pactuantes terão liberdade para contratar e estabelecer, assim, sua vontade.

Sob este prisma, dentre inúmeras cláusulas estipuladas em determinado contrato, as arras são usualmente utilizadas. Elas consistem no sinal de pagamento, no qual uma parte entrega à outra um determinado bem móvel (geralmente “dinheiro”) como uma garantia das obrigações pactuadas. Quando o contrato é cumprido a tempo e a modo, as arras poderão ser devolvidas ou decotadas do valor global do acordado, o que usualmente acontece.

Fato é que, nos termos do art. 418 do Código Civil brasileiro (CCb), se a parte que entregou as arras não executar o contrato, poderá a outra parte tê-lo por desfeito e as reter, porém, caso a inexecução se der por conta daquela que recebeu as arras, a outra poderá dar o contrato como desfeito, exigindo, em decorrência, a sua devolução mais o equivalente.

Usualmente, dentro do mercado imobiliário, especialmente na promessa de compra e venda de um bem imóvel, os contratantes estabelecem um valor entregue a título de arras ou sinal de pagamento. Estas arras, aliás, serão confirmatórias quando prestadas no início da execução de um contrato que não admite o arrependimento, cabendo, inclusive, em caso de desistência ou inadimplemento, uma indenização suplementar, valendo o sinal de pagamento como valor mínimo. Eis o que afirma o art. 419 do CCb: “a parte inocente pode pedir indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima. Pode, também, a parte inocente exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras como o mínimo da indenização”.

As arras penitenciais, por sua vez, têm o condão de garantir o direito de arrependimento pactuado pelas partes, possuindo uma função meramente indenizatória. Neste caso, uma vez exercido o direito de arrependimento, as arras já garantem a indenização, não admitindo aquela de caráter suplementar. É o que afirma o art. 420 do CCB: “se no contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização suplementar”.

Exemplificativamente, se “Maria” firmou um negócio de compra e venda com “José” no valor equivalente a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), entregando este último R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de arras, sejam elas confirmatórias (o negócio não admite arrependimento), sejam elas penitenciais (existe a possibilidade de arrependimento), caso ela descumpra ou desista do negócio, perderá o valor dado a título de arras para ele. Por outro lado, tendo o “José” descumprido ou desistido do negócio, deverá devolver a “Maria” o valor que lhe foi entregue, mais o correspondente, ou seja, R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Frisa-se que, no caso de arras penitenciais, não poderá haver a cobrança de um valor de indenização suplementar, porque elas já são dadas com este caráter indenizatório.

No universo contratual, as arras e a cláusula penal – seja a moratória ou compensatória – são instrumento utilizados para compelir as partes ao cumprimento contratual. Uma diferença substancial é que as arras não pressupõem o descumprimento, integrando, assim, o preço do negócio. Por outro lado, é entendimento pacificado na jurisprudência, inclusive do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, mesmo sendo institutos jurídicos diferentes, é inadmissível a cumulação de cláusula penal compensatória (“a famosa multa rescisória”) com as arras, prevalecendo esta última, caso presente, na hipótese de inexecução contratual.

Quanto à cláusula penal, trata-se de um tema igualmente relevante a ser trabalhado em outro momento. Fiquem atentos às publicações desta e de outros autores.

 

CONHEÇA MAIS SOBRE JOSIANE MAFRA:

Josiane Mafra é advogada graduada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV/MG), assessora e consultora jurídica, especialista em Direito Público (UNEC) e em Planejamento, Implementação e Gestão de Cursos de Educação a Distância (UFF-RJ). Mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade (UNEC). Articulista, parecerista e palestrante, com experiência, há 18 anos, junto aos mercados imobiliário, urbanístico e ambiental. Membro do Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG). Autora de diversas obras, dentre elas o “Livro digital de Documentação Imobiliária: aspectos teóricos e práticos” e o “Guia digital de Contratos Imobiliários”. Co-autora do livro “Segredos das mulheres empreendedoras do mercado imobiliário

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