Muito se fala em Patrimônio de Afetação nos dias de hoje, contudo, poucos sabem os percalços que a construção civil, o judiciário e mesmo os órgãos de defesa ao consumidor percorreram até chegarmos na legislação de hoje. Mas e você atuando no mercado imobiliário, Sabe o porquê ele foi criado e o que visa resguardar?
De maneira bem sucinta, mas, afim de desmistificar a expressão que tanto aparece hoje nos instrumentos contratuais de compra e venda na planta, ou mesmo nos indesejáveis instrumentos de distrato, vimos aclarar o instituto. Vamos iniciar pela motivação principal à época: a falência de uma das maiores incorporados brasileiras em meados do ano de 1999, A Construtora, ENCOL ENGENHARIA.
A situação foi tão alarmante, que até hoje, 23 (vinte e três) anos após a decretação de sua falência, existem processos judiciais em trâmite e, cerca de 7,5 mil funcionários e 42 mil adquirentes aguardando pelo ressarcimento de valores pagos cumulados com indenizações.
Com base na situação de catástrofe proveniente da falência, o Governo se viu na necessidade de criar um instrumento que viesse assegurar os compradores de unidades na planta (promissários compradores), ou seja, aqueles que firmam contratos de obrigação de pagamento de valores mensais a incorporadora por algo que ainda não está pronto. Na maioria das vezes, nem iniciado.
Foi então que o governo, pós falência, aprovou medida provisória que, ratificada, tornou-se a lei 10.931/04, que veio emendar a lei de incorporações 4.591/64 e trouxe o famoso, P.A na incorporação imobiliária.
Nesse sentido, o Patrimônio de Afetação que fica gravado na matrícula do imóvel (direito real de garantia) e salvaguarda o direito e valores empenhados pelo consumidor/adquirente, passou a oferecer benefício fiscal para o incorporador que viesse instituir o P.A em sua obra, tendo uma considerável redução na tributação.
Mas então, como funciona esse gravame com regime tributário especial (RET)?
A incorporadora que institui o Patrimônio de Afetação em sua obra, passa a ter um CNPJ para cada obra, e, em conjunto, uma conta bancária separada de seu patrimônio empresarial. É uma conta criada com o objetivo d receber os valores pagos/depositados mensalmente pelos promissários compradores, a qual, chamamos de contabilidade apartada.
Em eventual falência, essa conta fica resguardada ao empreendimento vinculado, não respondendo aos demais credores da incorporadora e resguardado para que, por vias previstas na lei, se monte um grupo (associação) dos adquirentes, para, em conjunto dos conselheiros e profissionais técnicos de outra incorporadora, possam dar seguimento e concluir a obra.
Frise-se, o Patrimônio de Afetação não é novidade, porém, mesmo com os benefícios fiscais ofertados na 10.931/04 e posteriores, não era tão divulgado. Muitos desconheciam a lei e os poucos que conheciam, faziam péssimas interpretações de seu efeito, deixando, por conseguinte, de instituí-lo.
Eis que, após muitas tentativas de acordo ao longo dos anos, ensaiou-se uma melhoria em 2015, vindo a chamar a devida atenção apenas em dezembro de 2018, quando, com a nova emenda à lei de incorporações (Lei 13.786/18), chamada popularmente de “Lei dos distratos”, trouxe mais benefícios aos incorporadores, ao oferecer um percentual de retenção maior ao incorporador em eventual distrato da venda/compra, em troca de instituir o P.A em sua obra, e não aplicar de maneira arbitrária os valores recebidos dos adquirentes, em outras obras (desvio de valores/efeito bicicleta).
OAB/SC 35.851
Advogada proprietária do escritório Pavão E Associados – Advocacia e Consultoria Imobiliária.
Especialista em Direito Empresarial, Tributário e Imobiliário.
Diretora Regional NSC do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário
Autora de cursos na área imobiliária
Palestrante da área imobiliária
Técnica em Transações imobiliárias