Primeiramente, é importante salientar que o incorporador pode eleger regimes de construção para a incorporação imobiliária, e que o regime de construção adotado influencia diretamente na escolha do instrumento contratual a ser elaborado.
Os regimes tradicionais de construção são: a) construção por conta e risco do incorporador; b) construção por empreitada; c) construção por administração. [1]
Na construção por conta e risco do incorporador, também conhecida como “preço e prazo certo”, o incorporador se compromete a construir o empreendimento imobiliário e entregar a unidade ao adquirente, sem que esse tenha qualquer envolvimento direto ou indireto com a construção.
Já nas construções pelos regimes empreitada e por administração, a construção poderá ficar sob a reponsabilidade, ainda que indiretamente, dos adquirentes. Nessas modalidades, o adquirente está realizando a compra, ou a promessa de compra, de fração ideal do terreno vinculada à unidade autônoma e, simultaneamente, contratando a construção em um dos dois aludidos regimes.
Os dois principais instrumentos contratuais utilizados para a venda das unidades autônomas em uma incorporação imobiliária são: a) o contrato de promessa de compra e venda da unidade autônoma (coisa futura), utilizado nos casos em que a incorporação é por conta e risco do incorporador; b) o contrato de promessa de compra e venda de fração ideal do terreno vinculado a contrato de construção da unidade, quando o regime de construção é por empreitada ou administração.[2]
Não obstante ambos os contratos objetivarem a alienação de fração ideal de terreno vinculada à unidade autônoma, eles apresentam diferenças substanciais.
O contrato de promessa de compra e venda de unidade autônoma (coisa futura) instrumentaliza a obrigação de o incorporador (promitente vendedor) construir o empreendimento e entregar a unidade imobiliária acabada (ainda inexistente quando da contratação), devidamente regularizada com matrícula individualizada no Registro de Imóveis, a preço e prazo predeterminados; e a obrigação do promitente comprador de adquirir a unidade, pagando integralmente o preço, nas condições estabelecidas pelas partes.
Por outro lado, o contrato de promessa de compra e venda de fração ideal do terreno vinculado a contrato de construção da unidade trata-se de instrumento pelo qual o adquirente (promitente comprador) realiza a compra, ou promessa de compra, da fração ideal do terreno vinculada à unidade autônoma e, simultaneamente, contrata a construção por empreitada ou por administração. Se os dois objetos constarem do mesmo instrumento contratual, perfectibiliza-se um contrato de promessa de compra e venda de fração ideal de terreno com contrato de construção da unidade imobiliária.[3]
O contrato de promessa de compra e venda de unidades em incorporação pelo regime de construção por conta e risco do incorporador tem previsão nos arts. 41 a 43, da Lei das Incorporações Imobiliárias (Lei 4591/64).
Já o contrato de promessa de compra e venda de fração ideal de terreno vinculado a contrato de construção da unidade, tem as regras gerais estabelecidas no art. 48, da Lei 4591/64, e as especificas para: a) construção pelo regime de administração – art. 58 e 59; b) construção pelo regime da empreitada – art. 55 da Lei das Incorporações Imobiliárias.
Observe que o instrumento contratual será eleito e as obrigações do incorporador identificadas, a depender do regime de construção adotado para a incorporação imobiliária. Portanto, imprescindível a menção expressa no contrato do regime de construção adotado pelo incorporador (promitente vendedor).
Conforme já mencionado, se eleito o regime de construção por conta e risco do incorporador, o contrato terá como objeto a compra e venda da unidade autônoma como coisa futura, sendo desnecessário discriminar, de forma separada, a aquisição da fração ideal de terreno e a contratação da construção, bastando indicar que a construção ocorrerá por preço e prazo certos, conforme arts. 41 a 43-A, da Lei 4591/64.
Todavia, se o regime de construção adotado na incorporação imobiliária for por administração ou empreitada, existirá, também, a contratação da construção pelo adquirente. Nessa hipótese, haverá a compra e venda da fração ideal do terreno com a construção da unidade imobiliária. À vista disso, será necessário deixar claro no contrato que existem duas obrigações diferentes do incorporador (vender e construir). Também é essencial cláusula contratual indicando se o regime de construção é por administração ou por empreitada. Nessa cláusula, devem constar, ainda, tudo o que foi acertado (combinado) quanto à construção, como a obrigação de o construtor observar e cumprir o plano de construção aprovado, bem os prazos estabelecidos para a conclusão da obra, dentre outras obrigações.
Importante ressaltar que o presente texto se limita às principais diferenças dos instrumentos contratuais supramencionados, todavia, há outros cuidados e cláusulas a serem observados e inseridas quando da elaboração desses contratos.
Um ponto que merece especial atenção é o fato de que a validade da compra e venda de imóveis está condicionada à celebração de escritura pública, excetuando-se os casos de imóveis com valor igual ou inferior 30 (trinta) salários-mínimos, e a transferência da propriedade só se dá com o registro da escritura na matrícula do imóvel perante o Registro de Imóveis competente, consoante arts.1.227 e 1.245, do Código Civil.
A compra e venda de unidades em incorporação imobiliária, geralmente, adota o formato inicial de promessa de compra e venda, em que as partes se comprometem à celebração de um contrato definitivo, por meio de escritura pública. Na maioria dos casos, a outorga da escritura ocorre quando do cumprimento integral das obrigações pelo promitente comprador, que poderá, ou não, coincidir com a data do término da obra ou da entrega das unidades.
É importantíssima a previsão discriminada da ordem cronológica dos atos (promessa, escritura e registro) no contrato de promessa de compra e venda, detalhando as obrigações de cada parte, os prazos e as condições em que cada um dos eventos deve acontecer.
Por fim, não é demais ressaltar que o contrato de compra e venda de unidades em incorporação imobiliária, independentemente do regime de construção adotado pelo incorporador, tem muitas peculiaridades e detalhes, demandando muita atenção e cuidado quando da sua elaboração.
Advogada especialista em Direito Imobiliário
15 anos de atuação nas áreas imobiliária e empresarial
LLM em Negócios Imobiliários.
Especialista em Direito Processual Civil.
LLM em Direito Empresarial em curso.
[1] SOUBIHE, Andréa de Faria. Regimes jurídicos de contratos de construção: aproximações e diferenças. In: FARIA, Renato Vilela (coord.); CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e. Operações Imobiliárias – estruturação e tributação. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 345-346.
[2] BORGES, Marcus Vinícius Motter Borges. Compra e Venda de Unidades em Incorporação Imobiliária. In: BORGES, Marcus Vinícius Motter Borges(coord.). Manual dos Contratos Imobiliários. São Paulo:Thomson Reuters Brasil, 2023, p. 81.
[3] [3] BORGES, Marcus Vinícius Motter Borges. Compra e Venda de Unidades em Incorporação Imobiliária. In: BORGES, Marcus Vinícius Motter Borges(coord.). Manual dos Contratos Imobiliários. São Paulo:Thomson Reuters Brasil, 2023, p. 82