Quando o cliente quer a sua alma: a exaustão invisível de quem vende sonhos

Por Thais Oliveira Almeida – Engenheira Civil, Construtora e Treinadora Comportamental

 

O mercado imobiliário é movido por sonhos. A casa própria, o novo investimento, o refúgio do final de semana, o início de uma nova vida. E quem está na linha de frente para transformar esses sonhos em realidade? Nós, os corretores e construtores. Mas por trás dos contratos assinados e das fotos com chave na mão, existe uma realidade que poucos veem: a exaustão emocional de quem vive em modo de guerra, todos os dias.

 

Quando o cliente exige mais do que um imóvel

Atendemos pessoas em momentos decisivos da vida. E, muitas vezes, o que elas trazem para a mesa não é só um CPF e uma ficha de crédito. Elas trazem ansiedade, frustrações, traumas com bancos, medo de rejeição, insegurança com o futuro. Tudo isso é jogado, inconscientemente, sobre o profissional que está ali tentando ajudar.

E em vez de gratidão, muitas vezes, recebemos grosseria. Desrespeito. Gritos. Silêncios que duram dias e, de repente, viram cobranças absurdas. Comentários ácidos como “você só quer vender”, “só pensa em dinheiro”, ou até “está me enrolando”.

Mal sabem eles que, do outro lado, tem alguém que passou a madrugada fazendo simulação, ligou para gerente, tentou encaixar o perfil no sistema da Caixa, respondeu mensagens no domingo à noite… e ainda assim sente que não foi suficiente.

 

O custo invisível: saúde mental

Essa rotina cobra um preço. E alto.

  • Insônia crônica: A mente não desliga. E-mails pendentes, clientes insatisfeitos, taxas que mudaram de última hora.
  • Crises de pânico: Atendimentos que geram suor frio, taquicardia e vontade de desaparecer.
  • Síndrome de burnout: Exaustão física e emocional extrema, que nos faz perder o prazer e o sentido do que fazemos.
  • Autoestima abalada: Quando ser desvalorizado vira rotina, começamos a duvidar do nosso próprio valor.

 

O ciclo silencioso da culpa

Muitos profissionais vivem um ciclo perigoso: são maltratados → se sentem mal por não aguentar → se cobram por não darem conta → se culpam por querer desistir. É como se sentir cansaço fosse sinal de fraqueza.

E aqui está uma verdade dura, mas necessária: não é fraqueza. É cansaço de guerra. De batalhas diárias com pessoas que esquecem que por trás do crachá, tem um ser humano.

 

O mercado que não educa o cliente

Existe uma romantização do corretor incansável. Aquele que atende a qualquer hora, resolve tudo, sorri diante da grosseria e ainda agradece a oportunidade. Isso não é profissionalismo. É exploração emocional. E precisa acabar.

Clientes também precisam ser educados. Precisam entender que:

  • Profissional não é servo.
  • Limite é sinal de organização.
  • Respeito é o mínimo.
  • “Empatia” não é só quando é conveniente pra eles.

Enquanto o mercado continuar premiando o profissional que mais se sacrifica, continuaremos formando vendedores exaustos, doentes e insatisfeitos.

 

A reconstrução começa de dentro

A boa notícia é que é possível virar esse jogo. Mas começa dentro de cada um de nós. Escolhendo nos priorizar. Valorizando nossa saúde antes da comissão. Sabendo dizer “não”. Sabendo desligar o celular. Sabendo reconhecer que saúde mental é o maior patrimônio que temos.

Construir uma carreira sustentável significa colocar limites. Atender com presença e verdade, mas não com submissão. Significa aprender a identificar um cliente tóxico e ter coragem de encerrar esse atendimento antes que ele destrua sua energia.

 

E se o mercado fosse mais humano?

Imagine um mercado onde:

  • O corretor fosse treinado não só em vendas, mas em inteligência emocional.
  • A liderança valorizasse o bem-estar da equipe tanto quanto os resultados.
  • Os clientes recebessem orientação sobre o processo — e sobre o respeito que ele exige.
  • As redes sociais mostrassem a realidade do bastidor, e não só a “chave na mão”.

Esse mercado não é utopia. Ele começa com cada um de nós. Com coragem para ser exemplo. Com postura para se posicionar. Com empatia consigo mesmo.

 

Porque no fim do dia…

…não estamos vendendo tijolos. Estamos construindo destinos. E nenhum destino é sustentável se, no caminho, perdemos a nós mesmos.

Você merece construir uma vida com equilíbrio. Com saúde. Com respeito.

Porque ninguém deveria adoecer para ajudar alguém a realizar um sonho

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