Aspectos práticos da adjudicação compulsória extrajudicial e as novidades do Provimento 150/2023 do CNJ

Nos últimos anos, várias mudanças normativas têm tornado a resolução de conflitos fora dos tribunais cada vez mais atraente. Isso acontece porque o sistema judiciário está sobrecarregado e a judicialização é, na maioria das vezes, a forma mais custosa de resolver um problema – afinal, tempo custa também. Por isso, as pessoas estão buscando cada vez mais a adoção de medidas preventivas e a via administrativa.

Uma série das principais mudanças legislativas que contribuíram para isso foi a Lei Federal nº 14.382, de 27 de junho de 2022. Essa lei trouxe várias inovações importantes, como o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP), que facilita o registro de documentos e a conclusão das transações imobiliárias.

Além disso, ela também tratou de questões relacionadas a incorporações e introduziu o procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial, que agora pode ser feito fora dos tribunais. Essa nova possibilidade foi criada a partir da inclusão do artigo 216-B na lei de Registros Públicos (Lei Federal nº 6.015/73).

A adjudicação compulsória extrajudicial é um procedimento que permite que as pessoas que adquiriram imóveis registrem esses imóveis em seu nome, mesmo se o alienante descumprir o contrato (recusa injustificada de assinatura de escritura pública), falecer, estiver desaparecido ou incapaz. No caso de empresas, o procedimento pode ser usado quando elas forem extintas.

Essas mudanças desburocratizaram o procedimento da adjudicação, antes exclusivamente judicial, e por isso são muito interessantes para advogados e para o mercado imobiliário em geral. Afinal de contas, viabiliza apresentação de medidas mais eficazes ao cliente, em caso de descumprimento de obrigações por uma das partes.

No entanto, no começo, a adoção da adjudicação compulsória fora dos tribunais foi muito tímida e muitas pessoas não a utilizaram imediatamente justamente por falta de regras ou de parâmetros procedimentais. Isso aconteceu porque os poucos parágrafos do único artigo que mencionava essa possibilidade de resolução administrativa tratavam apenas brevemente sobre quando ela poderia ser usada, isto é, não explicavam como o procedimento funcionaria na prática.

Ou seja, sabia-se que era possível pedir a adjudicação em um cartório, mas na prática surgiam muitas dúvidas sobre como fazer isso ou se era possível usar a via extrajudicial em certos casos específicos.

Sendo assim, o Conselho Nacional de Justiça publicou o Provimento nº 150/2023, responsável por alterar o antecedente, Provimento nº 149/223 – o Código de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça. O provimento mais recente ampliou de forma expressa as hipóteses de cabimento da adjudicação compulsória extrajudicial, antes abrangente dada uma certa omissão, além de instituir um procedimento a ser adotado pelas partes e cartórios (notariais e registrais).

Quanto ao cabimento da adjudicação compulsória, temos a inclusão das promessas de permuta e casos de sucessão. Nesse sentido, o processamento administrativo passa a ser cabível para negócios da seguinte espécie: promessa de compra e venda, promessa de permuta, cessão e sucessão, contanto que não haja direito de arrependimento exercitável.

Cumpre destacar que o arrependimento exercitável não será óbice à adjudicação apenas nos casos em que o imóvel tenha sido objeto de parcelamento de solo urbano ou de incorporação imobiliária, com prazo de carência já decorrido.

Outra novidade, é que o pedido poderá apresentar a intenção de adjudicações cumulativas de imóveis distintos em um único processo. Contudo, tal aproveitamento de processo só será possível se: (a) todos os imóveis cuja adjudicação se pretende estiverem sob a mesma circunscrição; (b) haja coincidência de interessados ou legitimados, ativa e passivamente; e, (c) a cumulação pretendida não resulte em prejuízo ou dificuldade ao bom andamento do processo.

Quanto à eleição de cartórios, o provimento estipula que o processo será conduzido pelo Cartório de Registros de Imóveis da circunscrição do imóvel cuja adjudicação se pretende. Porém, a ata notarial poderá ser lavrada por Tabelião de Notas da escolha do interessado (comprador, permutante, cedente ou sucessor), salvo se houver diligências no local do imóvel devendo ser observadas as normas de competência territorial do Código Nacional de Normas.

Além da escolha do Tabelião, o provimento dispõe de forma detalhada critérios para elaboração da ata notarial. Entre eles, quais os documentos serão hábeis para a prova de quitação.

Quanto às questões envolvendo possíveis ônus ou dívidas, temos que comprovação de regularidade fiscal do transmitente não é condição para deferimento de registro da adjudicação, nos termos do artigo 440-A. Ademais, a partir da leitura do artigo 440-AG, depreende-se que os direitos reais, ônus e gravames que não impeçam atos de disposição voluntária da propriedade não impedirão a adjudicação.

Segundo o Provimento nº 150, o pagamento do imposto de transmissão deverá ser comprovado pelo requerente antes da lavratura do registro, dentro de cinco dias úteis, contados da respectiva notificação do Oficial de Registro de Imóveis. O prazo poderá ser sobrestado se houver justo impedimento, mas o processo será extinto em casos de ausência de pagamento injustificável.

A maioria dos prazos do procedimento de adjudicação extrajudicial serão determinados pelo Oficial de Registro de Imóveis, sendo certo que alguns dispositivos apenas trazem prazo determinado, sendo todos esses contados em dias úteis, conforme expressamente consignado.

Ainda que o processamento da adjudicação compulsória seja pela via extrajudicial, a partir da publicação do provimento, instituiu-se a obrigatoriedade do requerente estar assistido por advogado ou defensor público , os quais deverão ser constituídos por meio de procuração com poderes específicos.

Enquanto não for editada, no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, legislação acerca de emolumentos para o processo de adjudicação compulsória extrajudicial, a elaboração da ata notarial com valor econômico e o processamento do pedido pelo oficial de registro de imóveis serão feitos na forma de cobrança da usucapião pela via extrajudicial, ressalvados os atos de notificação e de registro.

Certo que, mesmo com tal regulamentação, ainda remanescem algumas dúvidas de como determinadas particularidades afetariam ou seriam tratadas pelo Oficial no curso de tal processo extrajudicial. Como é o caso da ausência de comprovação de pagamento, mas certificado o decurso do prazo prescritivo de cobrança sem o pedido de rescisão do pré-contrato.

Porém, a regulamentação trazida pelo Provimento de nº 150 traz tranquilidade para os operadores do mercado imobiliário de modo geral, ao passo em que padroniza as formas de processamento e cabimento de tal medida administrativa.

Com esses procedimentos padronizados, há uma contribuição significativa para alcançar, em breve, a tão almejada segurança jurídica. Este é um passo crucial rumo à resolução eficaz das complexidades dos casos específicos, promovendo uma base sólida para o futuro prioritária e majoritariamente extrajudicial.

 

CONHEÇA MAIS SOBRE A AUTORA DESTE POST:

VICTÓRIA DIEZ

Advogada apaixonada pelo mercado imobiliário.

Nascida e criada em Londrina – PR, minha jornada acadêmica foi marcada pela busca constante pela excelência.

Concluí minha pós-graduação em Direito Empresarial na Escola Brasileira de Direito e aprofundei meu conhecimento em direito imobiliário ao obter meu título de especialista em direito e negócios imobiliários através do Master of Laws (LL.M) da Fundação Escola Superior do Ministério Público.

Durante meus cinco anos de atuação no dinâmico mercado imobiliário, dediquei-me intensamente à análise de riscos envolvendo transações e contratos imobiliários diversos. Para mim, a verdadeira maestria vem da combinação harmoniosa de diversas áreas de conhecimento, nos âmbitos prático e teórico.

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